Foto: Lou Gaioto |
O pensamento, com seu conteúdo emocional e sensitivo, não é
amor. O pensamento nega, invariavelmente, o amor. O pensamento funda-se na memória, e o amor não é memória. Quando pensamos a respeito de alguém que amamos, este pensamento não é amor.
Podemos ter a lembrança dos hábitos, das maneiras, das idiossincrasias de um amigo, e pensar nos incidentes agradáveis ou desagradáveis ocorridos nas nossas relações com ele, mas os quadros evocados pelo pensamento não representa o amor. O pensamento, por sua própria natureza, é separativo. A noção de tempo e espaço, de separação e sofrimento nasce do processo do pensamento, e só quando este cessa, pode existir o amor.
O pensamento gera inevitavelmente o sentimento de posse, aquela
ânsia de posse que, consciente ou inconscientemente, nutre o ciúme. Onde está o ciúme, naturalmente não pode estar o amor; e, no entanto, pela maioria das pessoas, o ciúme é considerado um sinal de amor. O ciúme é resultado do pensamento, uma reação do
conteúdo emocional do pensamento. Quando vemos contrariado o
sentimento de possuir ou de ser possuídos fica-nos um vazio de tal
ordem que a inveja vem preencher o lugar do amor. E porque o
pensamento representa o papel do amor que surgem todas as complicações e tristezas da vida.
Se não pensamos em alguém, direis que não amamos. Mas, é
amor pensarmos na pessoa? Se nunca pensásseis num amigo a quem julgais amar, isso vos causaria certo horror, não e verdade? Se não pensásseis num amigo falecido, vos consideraríeis desleal, desamoroso etc. Qualificaríeis tal estado de insensível, indiferente
etc.; e trataríeis por isso de pensar em tal pessoa, guardando retratos
dela, imagens feitas pela mão e pela mente; encher, porem, assim, o
coração com as coisas da mente significa não deixar espaço para
o amor. Quando estais na companhia de um amigo, não pensais nele;só na sua ausência, o pensamento começa a recriar cenas e ocorrências mortas. Esta ressurreição do passado é chamada amor. Por conseguinte, para a maioria de nós, o amor é morte, negação da vida;
Vivemos-nos com o passado, com os mortos, e por isso estamos também mortos, embora chamemos a isso amor.
O processo do pensamento nega sempre o amor. O pensamento
é que tem complicações emocionais, e não o amor. O pensamento é o maior obstáculo ao amor. O pensamento cria uma divisão entre
o que é e o que deveria ser, e nesta divisão se baseia a nossa moral;
Entretanto, nem o homem moral nem o imoral conhecem o amor. Esta estrutura moral, criada pela mente para manter coesas as relações sociais, não é amor, mas um processo de contínuo enrijecer, qual o do cimento. O pensamento não conduz ao amor, não pode cultivar o amor; pois o amor não é cultivável como planta de jardim. O próprio desejo de cultivar o amor é ação do pensamento.
Se ficardes vigilante, por pouco que seja, vereis o papel importante
Que o pensamento representa na vida. O pensamento tem,
naturalmente, seu devido lugar, mas não está sob nenhum aspecto
relacionado com o amor. O que se relaciona com o pensamento
pode ser compreendido pelo pensamento, mas o que se relaciona com o pensamento não pode ser alcançado pela mente. Perguntareis: Que é então o amor? O amor é um estado de ser, em que não existe pensamento; a própria definição do amor e um processo do pensamento. E, por isso mesmo, não é amor.
Temos de compreender o próprio pensamento, e não procurar
aprisionar o amor com o pensamento. A negação do pensamento
não gera o amor. São se está libertado do pensamento quando se
compreendeu plenamente o seu significado profundo; e, para tanto,
o essencial é o autoconhecimento profundo, e não a asserções vãs e
superficiais. A meditação e não a repetição, o percebimento e não
as definições é que revelam as atividades do pensamento. Se
não estamos vigilantes e tomando conhecimento das atividades do
pensamento, o amor não pode existir.
(J. K R I S H N A M U R T I - COMENTÁRIOS SOBRE O VIVER)
Nenhum comentário:
Postar um comentário