sábado, 21 de dezembro de 2019

Amigos(as) do Zen Brasília

Estaremos em recesso de 23/12/2019 a 07/01/2020



Retorno dia 08/01 - às 19h30 - Zazen


A paz do indivíduo será a paz do mundo!

Gassho!




(Foto: Tatiana Rehbein)

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Nos sentamos 7 dias e 7 noites, 
seguimos até surgir a estrela da manhã.

Homenagem a Xaquiamuni Buda.

Homenagem a Mahaprajapati, e toda linhagem das Mulheres.

Gassho!






🙏🙏🙏

quinta-feira, 28 de novembro de 2019

No Budismo, as dificuldades são verdadeiras oportunidades


foto: povos do Xingu - MT - acervo C imi


Usando nossas dificuldades e problemas para despertar nossos corações


Comentário de Pema Chödrön:

Quando li pela primeira vez os ensinamentos de lojong (“treinamento da mente”) em O Grande Caminho do Despertar pelo professor tibetano do século XIX Jamgön Kongtrül, o Grande, fiquei impressionada com a mensagem incomum deles de que podemos usar nossas dificuldades e problemas para despertar nossos corações. Em vez de ver os aspectos indesejáveis ​​da vida como obstáculos, Jamgön Kongtrül apresentou-os como a matéria-prima necessária para despertar a compaixão genuína e descontrolada. Ao passo que, no comentário de Kongtrül, a ênfase está principalmente em assumir o sofrimento dos outros, é evidente que nesta era atual é necessário também enfatizar que o primeiro passo é desenvolver a compaixão por nossas próprias feridas.

É a compaixão incondicional por nós mesmos que leva naturalmente à compaixão incondicional pelos outros. Se estivermos dispostos a nos apoiar totalmente e a nunca desistirmos de nós mesmos, poderemos nos colocar no lugar dos outros e nunca desistir deles. A verdadeira compaixão não vem do desejo de ajudar os menos afortunados que nós mesmos, mas de percebermos nosso parentesco com todos os seres.

Os ensinamentos de lojong são organizados em torno de sete pontos que contêm cinquenta e nove slogans expressivos que nos lembram como despertar nossos corações. Aqui apresentamos dezenove desses slogans:

Primeiro, treine nas preliminares.

As preliminares também são conhecidas como os quatro lembretes. Em sua vida diária, tente:

1. Manter uma consciência da preciosidade da vida humana.

2. Esteja ciente da realidade que a vida termina; a morte vem para todos.

3. Lembre-se de que o que você faz, virtuoso ou não, tem um resultado; o que vai volta.

4. Contemplem que, enquanto você estiver muito focado em auto-importância e muito envolvido em pensar em como você é bom ou ruim, você sofrerá. Obcecar-se em conseguir o que quer e evitar o que não quer não resulta em felicidade.

Considere todos os dharmas como sonhos.

O que quer que você experimente em sua vida – dor, prazer, calor, frio ou qualquer outra coisa – é como algo acontecendo em um sonho. Embora você possa pensar que as coisas são muito sólidas, elas são como passar memória. Você pode experimentar essa qualidade aberta e não definida na meditação sentada; tudo o que surge em sua mente – odeia amor e todo o resto – não é sólido. Embora a experiência possa ser extremamente vívida, é apenas um produto da sua mente. Nada sólido está realmente acontecendo.

O envio e a tomada devem ser praticados alternadamente. Esses dois devem respirar.

Esta é uma instrução para uma prática de meditação chamada tonglen . Nesta prática, você envia felicidade aos outros e aceita qualquer sofrimento que os outros sintam. Você aceita com uma sensação de abertura e compaixão e manda no mesmo espírito. As pessoas precisam de ajuda e, com essa prática, nos estendemos a elas.

Conduza todas as culpas em uma.

Este é um conselho sobre como trabalhar com seus semelhantes. Todo mundo está procurando alguém para culpar e, portanto, a agressividade e a neurose continuam se expandindo. Em vez disso, pare e olhe o que está acontecendo com você . Quando você se agarra com tanta força à sua visão do que eles fizeram, você fica viciado. A sua própria justiça faz com que você se acostume e sofra. Portanto, trabalhe para resfriar essa reatividade em vez de aumentá-la. Essa abordagem reduz o sofrimento – seu e de todos os outros.

Seja grato a todos.

Outros sempre mostrarão exatamente onde você está preso. Eles dizem ou fazem alguma coisa e você automaticamente fica preso a uma maneira familiar de reagir – desligando, acelerando ou ficando todo nervoso. Quando você reage da maneira habitual, com raiva, ganância e assim por diante, isso lhe dá a chance de ver seus padrões e trabalhar com eles de forma honesta e compassiva. Sem outros te provocando, você permanece ignorante de seus hábitos dolorosos e não pode treiná-los para transformá-los no caminho do despertar.

Todo o dharma concorda em um ponto.

Todos os ensinamentos budistas (dharma) são sobre diminuir a auto-absorção, o apego ao ego. Isso é o que traz felicidade para você e para todos os seres.

Das duas testemunhas, segure a principal.

As duas testemunhas do que você faz são os outros e você mesmo. Destes dois, você é o único que realmente sabe exatamente o que está acontecendo. Portanto, trabalhe com a visão de si mesmo com compaixão, mas sem qualquer auto-engano.

Sempre mantenha apenas uma mente alegre.

Aplique constantemente alegria, se não por outro motivo, porque você está neste caminho espiritual. Tenha um sentimento de gratidão por tudo, até mesmo emoções difíceis, devido ao seu potencial de acordá-lo.

Abandone qualquer esperança de fruição

A instrução chave é ficar no presente. Não seja pego na esperança de que você vai conseguir e quão boa a sua situação será algum dia no futuro. O que você faz agora é o que importa.

Não seja tão previsível.

Não guarde rancor contra aqueles que fizeram você errado.

Não difame os outros.

Você fala mal dos outros, pensando que vai fazer você se sentir superior. Isso só semeia sementes de maldade em seu coração, fazendo com que os outros não confiem em você e o façam sofrer.

Não leve as coisas a um ponto doloroso.

Não humilhe as pessoas.

Não aja com uma torção.

Agir com uma reviravolta significa ter um motivo ulterior de se beneficiar. É a abordagem sorrateira. Por exemplo, para conseguir o que você quer para si mesmo, você pode temporariamente levar a culpa por algo ou ajudar alguém.

Todas as atividades devem ser feitas com uma intenção.

Seja o que for que você esteja fazendo, tome a atitude de querer, direta ou indiretamente, beneficiar os outros. Tome a atitude de querer aumentar sua experiência de parentesco com seus semelhantes.

Qualquer um dos dois ocorre, seja paciente.

O que quer que aconteça em sua vida, alegre ou doloroso, não seja eliminado pela reatividade. Seja paciente consigo mesmo e não perca seu senso de perspectiva.

Treine nas três dificuldades.

As três dificuldades (ou, as três práticas difíceis) são reconhecer sua neurose como neurose, não fazer a coisa habitual, mas fazer algo diferente para interromper o hábito neurótico e fazer dessa prática um modo de vida.

Não interprete mal.

Há seis ensinamentos que você pode interpretar erroneamente: paciência, desejo, entusiasmo, compaixão, prioridades e alegria. As interpretações erradas são:

1. Você é paciente quando isso significa que você conseguirá o que quer, mas não quando sua prática despertar desafios.

2. Você anseia por coisas mundanas, mas não por um coração e uma mente abertos.

3. Você se empolga com a riqueza e o entretenimento, mas não com o seu potencial para a iluminação.

4. Você tem compaixão por aqueles que gosta e admira, mas não por aqueles que não gosta.

5. O ganho mundano é a sua prioridade, em vez de cultivar a bondade amorosa e a compaixão.

6. Você sente alegria quando seus inimigos sofrem, mas você não se alegra com a boa sorte dos outros.

Não vacile

Se você treinar para despertar a compaixão apenas algumas vezes, isso retardará o processo de dar à luz a certeza. Treine de todo o coração para manter seu coração e mente abertos a todos.

Treine de todo o coração.

Treine entusiasticamente no fortalecimento de sua capacidade natural de compaixão e bondade amorosa.

O artigo acima foi extraído de “A caixa da compaixão” por Pema Chödrön, © 2003. Publicado por acordo com Shambhala Publications.

domingo, 3 de novembro de 2019

I Jornada de Zazen

I  Jornada  de  Zazen

Manhã e tarde de meditação - 7h às 18h 
As sessões serão de 20 ou 30 minutos 
Intervalos entre as sessões de 10 min. 
Você poderá entrar ou sair da sala durante os intervalos 

Será servido chá, café, frutas. 

Entre nesta jornada conosco! 

Mais informações: brasiliazenbrasilia@gmail.com








sexta-feira, 25 de outubro de 2019

Zazen para iniciantes - NOVO ENDEREÇO


Quando vemos expressões de intolerância, ódio, opressão e má vontade em nossas próprias mentes - tanto em nossa comunidade quanto no mundo - juramos, como indivíduos e como sangha, responder com pensamentos, 
palavras, ações amorosas.

Que juntos possamos aliviar o medo, o ódio, o egoísmo e a ilusão em nosso mundo.
(Declaração de inclusão - Zen Mountain Monastery)



arte: Gabriel Saikan Shimura

terça-feira, 22 de outubro de 2019

terça-feira, 8 de outubro de 2019

SHAKYAMUNI




Caso 

Shakyamuni Buda alcançou a Iluminação ao contemplar a estrela da manhã. No mesmo instante, disse:

 – Eu, a Grande Terra e todos os seres, simultaneamente, nos tornamos o Caminho. 

Circunstâncias 

Shakyamuni Buda nasceu na Índia e pertencia à linhagem do Sol. Aos dezenove anos de idade, durante o amanhecer, deixou os muros de seu palácio, raspou a cabeça na montanha Dantaloka e, por seis anos, praticou austeridades. Em seguida, permaneceu sentado, imóvel, ao longo de outros seis anos, no Assento do Diamante, enquanto aranhas teciam teias nas cavidades de seus olhos, gralhas se aninhavam no topo de sua cabeça e plantas se entrelaçavam em suas pernas. Aos trinta anos, no oitavo dia do décimo segundo mês, e no mesmo instante em que a estrela da manhã nascia no céu, Shakyamuni Buda subitamente alcançou a Iluminação. As palavras que citamos na exposição do caso foram seu primeiro rugido de leão. 

A partir daquele momento, sempre esteve acompanhado de seus discípulos e, durante os quarenta e nove anos seguintes, entregou-se de corpo e mente à transmissão do Darma, sem jamais abandonar o manto e a tigela de mendicante. Nesse período, exortou à assembleia em mais de trezentas e sessenta ocasiões e transmitiu o Olho Tesouro do Verdadeiro Darma a Makakashô, o mesmo tesouro que vem sendo transmitido de geração a geração, até chegar aos nossos dias – uma transmissão que, tanto na Índia, quanto na China e no Japão, constitui a essência da prática do verdadeiro Darma.

As práticas que Shakyamuni Buda executou ao longo de sua vida estabelecem as referências nas quais todos os seus seguidores devem se basear. Ainda que Shakyamuni Buda apresentasse as trinta e duas marcas maiores e as oitenta menores, não fazia a menor ostentação delas, e sua aparência era a de um velho monge, que em nada se diferenciava dos demais. Desde o exato momento em que Buda surgiu neste mundo, seus seguidores trataram de se comportar como ele, de empregar os mesmos recursos que ele e de agir, a todo momento – independentemente de estarem caminhando, de pé, sentados ou deitados –, da mesma forma como ele o fez. Assim, durante os três períodos do Darma Verdadeiro, do Darma Falso e do presente Darma Degenerado, a transmissão do Ensinamento, de Buda a Buda e de Ancestrais a Ancestrais, mantém viva a chama do Verdadeiro Darma. Essa mesma circunstância, por outro lado, ilustra o fato de que, embora os métodos de ensino que ele utilizou em seus trezentos e sessenta sermões não fossem sempre os mesmos – pois recorria a relatos e procedimentos estilísticos muito diversos –, todos eles, no entanto, não eram senão a expressão de um único princípio.


 Teishô 


O “eu” mencionado na exposição do caso não se refere especificamente a Shakyamuni Buda, pois tanto ele quanto a Grande Terra e todos os seres são originados a partir desse “eu”. Do mesmo modo que, quando recolhemos uma rede, também erguemos com ela todos os seus buracos, quando Shakyamuni Buda se iluminou, iluminaram-se também a Grande Terra e todos os seres. Mais que isso, não só a Grande Terra e todos os seres realizaram a Iluminação, mas também o fizeram todos os Budas do passado, do presente e do futuro. 

Sendo assim, não acredito que quem se iluminou, naquela ocasião, foi Shakyamuni Buda, porque não é possível conceber sua existência independente da Grande Terra e de todos os seres. Ainda que as montanhas, os rios e as dez mil formas floresçam em todas as direções, não devemos concluir, por isso, que algo exista fora da pupila do olho de Gautama. A pupila do olho de Gautama observa a todos, mas essa pupila também habita em vocês, porque é precisamente o olho de Gautama aquilo que acaba se tornando nosso corpo e mora em nosso interior, como um abismo de insondável profundidade. Portanto, não creiam que, no passado ou no presente, vocês e a resplandecente pupila de Buda têm sido, de algum modo, entidades diferentes. Nós somos a pupila de Gautama e Gautama é nossa autêntica totalidade. 

O que é, então, o que denominamos como “princípio da Iluminação”? Permitam-me, monges, que eu pergunte a vocês: é Gautama que se ilumina através de vocês ou são vocês que se iluminam através de Gautama? Pouco importa o que respondam, pois, em ambos os casos, não se trata da Iluminação de Gautama e, por isso mesmo, não estaríamos falando do princípio da Iluminação. 

Se vocês desejam verdadeiramente compreender o que é a Iluminação, devem se livrar de todas as noções relativas ao “eu” e a “Gautama”. Só então compreenderão a que nos referimos quando falamos do “eu”. Este “eu” é, ao mesmo tempo, a Grande Terra, todos os seres e o “e” que os une. Contudo, este “e” não é o “eu”, o velho companheiro Gautama. Considerem isso com muita atenção, reflitam com cuidado e procurem esclarecer tanto o “eu” quanto o “e”, porque de pouco lhes servirá clarificar o significado do “eu”, se não fizerem o mesmo com o “e”. 

Dessa forma, o “eu” e o “e” não são idênticos. Tampouco são diferentes. Para dizer a verdade, sua pele, carne, ossos e medula são completamente esse “e”. “O Dono da Casa” é esse “eu”, e não tem nada a ver com a pele, carne, ossos e medula, nem com os quatro elementos ou os cinco agregados. Não é por acaso a “Pessoa Imortal da Capela” algo separado de suas peles? Não acreditem, então, que se trate de algo idêntico à Grande Terra e à totalidade dos seres. 

É certo que as estações mudam e que as montanhas, os rios e a Grande Terra se modificam seguindo o ritmo das estações, mas vocês devem compreender que todas essas coisas não são nada além do arquear das sobrancelhas e do piscar de olhos de Gautama, e que tudo se encontra contido nesse corpo, o qual se ergue livre e independente no seio das miríades coisas. Por isso, o mestre Zen Fa-yen disse: “Não é possível afirmar que seja importante nem que não o seja.”, enquanto o mestre Zen Ti-tsang, por sua vez, perguntava: “O que você compreende por ‘as dez mil coisas’”? 

Entreguem-se completamente à prática, desenvolvam sua maestria e compreendam com profundidade a Iluminação de Shakyamuni Buda, a qual está vinculada à sua própria Iluminação. Vocês devem elucidar esse assunto, investigando o caso minuciosamente. Permitam que a resposta brote de seus corações, e não recorram a ensinamentos dados por budas do passado ou do presente. Deixem de lado toda explicação e me mostrem sua compreensão com uma frase livre de equívocos. 

Poema

 Este monge das montanhas gostaria de acrescentar algumas poucas e humildes palavras sobre este caso. Vocês gostariam de ouvi-las?

 Espinhos nascem por toda parte, enquanto a ancestral cerejeira abriga o broto de um galho resplandecente. 

Mestre Keizan Jokin Zenji (Taiso Josai Daishi). Denkoroku – Registros da Transmissão da Luz. (Tradução de Régis Monteiro Silva Luz, monge Koun, feita a partir da versão em inglês, de Francis Dojun Kook.)

terça-feira, 24 de setembro de 2019



O Mestre iniciou:


Entrar no Absoluto exige deixar o particular pra trás. Nós nos desengatamos ou desapegamos. Esse desapego não é feito pela pessoa, é feito de uma pessoa.

Todo apego implica medo, a suposição equivocada que algo precisa ser segurado.


É só quando o punho da morte é aberto que a verdadeira liberdade de todo medo por ser conhecida.

Todo desejo acontece por causa de um senso equivocado de insuficiência.

Todos as realizações de desejos são como uma refeição de arroz: pouco tempo depois e você está com fome de novo. Quando você percebe que não falta nada, que tudo que há é você e é seu, o desejo termina.

Desmonte o pêndulo do medo e desejo.

O chão debaixo de você é a Fonte e o Apoio.

Wu Hsin, em “Behind the Mind (the Short Discourses of Wu Hsin)” (2012)

quinta-feira, 22 de agosto de 2019

PENSAMENTOS DE MESTRE ECKHART

Sobre a maneira mais poderosa de rezar:

"A maneira mais poderosa de rezar, aquela que é capaz de obter qualquer coisa e é mais meritória, é a que deriva de uma mente desimpedida. Quanto mais desimpedida a mente, mais poderosa, útil e perfeita será a oração. O que é uma mente desimpedida? É aquela que não é perturbada nem alterada por nada, que não se apegou a qualquer modo especial de vida ou de devoção, e que não procura o seu próprio bem em nada, mas que está completamente imersa na preciosa vontade de Deus, tendo saído daquilo que lhe é próprio. Não há obra nenhuma que homens e mulheres possam executar, por mais pequena que seja, que não extraia daí o seu poder e a sua força".


MESTRE ECKHART (1260-1328)

Um dos mais famosos místicos da Idade Média, neste momento em plena fase de "redescoberta", Eckhart nasceu em Hochheim, Alemanha, em 1260. Aos 15 anos entrou para a ordem dos dominicanos. Foi vigário da Turíngia e depois provincial dos dominicanos na Saxônia. Nesse período, envolveu-se em intensos debates teológicos, divergindo muito dos franciscanos. A partir de 1314, morando em Estrasburgo, pregou para um grupo de freiras contemplativas. A audácia e amplitude do seu pensamento (com vigorosas incursões pela metafísica), aliadas às disputas teológicas que caracterizaram o período, provocaram uma bula de 1329 (quando ele já tinha falecido - Eckhart faleceu em 1328) em que o papa João XXII (segundo se diz, muito a contragosto) condenava 28 conceitos extraídos de suas obras (17 como heréticos e 11 como mal sonantes ou temerários). Antes que isso acontecesse, Eckhart já tinha apresentado, publicamente, a sua retratação por quaisquer impropriedades que o Vaticano viesse a encontrar em seus textos.
Muitos místicos seguiram e admiraram Mestre Eckhart, entre eles: Johannes Tauler, o beato Henrique Suso, santa Juliana de Norwich, o beato Ruysbroeck, Walter Hilton e o cardeal Nicolau de Cusa; mais tarde, foram influenciados por ele, santa Teresa de Ávila e são João da Cruz.

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Faz barulho porque não está completo


Texto de Shundo Aoyama, extraído do livro " Para uma pessoa bonita"





Quando fui convidada para uma cerimônia do chá em um certo templo, ao esperar na ante-sala, notei pendurada no tokonoma(1) a pintura de uma cabaça com as palavras do Mestre Zen Takashina Rosen(2): “Faz barulho porque não está completo”.

Fiquei emudecida diante do humor que ali se escondia, e, como se houvesse levado um golpe dolorido de um bastão, sem perceber exclamei: “uh!”

Uma cabaça cheia até a boca não tem som quando sacudida, mas se houver um pouco de saquê(3) lá no fundo, fará barulho. Os seres humanos são como cabaças: a pessoa sábia, iluminada, é tranquila em qualquer circunstância, como se nada a perturbasse. Exaltar-se, justificar-se e se lamentar são provas de falta de conteúdo. As palavras verdadeiras do Mestre Zen nessa pintura nos tocam profundamente.

Certa vez, tive essa mesma compreensão ao descer um córrego em uma canoa. Na nascente, onde a água é rasa, a superfície é agitada e barulhenta. Perto da foz, onde o riacho se torna profundo, a superfície é calma e tranquila, fluindo silenciosamente.

Sempre que começo a me sentir inquieta, lembro-me das palavras do Mestre Takashina Rosen.



(1)Tokonoma – nicho construído nas casas japonesas onde se colocam objetos de arte, peças raras, caligrafias ou pinturas, bem como arranjos de flores, seguindo regras estéticas tradicionais, marcando cada estação do ano, festividade ou encontro.
(2). Takashina Rosen (1896-1968) – Mestre Zen Daikan Doko (título recebido do Imperador Japonês) é o Grande Monge Gyokudô Rôsen, que foi abade superior dos dois templos sedes da Escola Soto Zen no Japão e fundador dos primeiros templos da Escola Soto Zen na América do Sul (Brasil).
(3) Saquê – bebida alcoólica de arroz fermentado.

sexta-feira, 16 de agosto de 2019

O QUE A PRÁTICA É


Praticantes - Zen Brasília - foto de André Jushin


A prática é muito simples. Isso, entretanto, não significa que não irá transformar por completo nossa vida. Quero rever o que fazemos quando sentamos, ou praticamos o zazen. Se acreditarem que já estão além disso, bem, podem pensar que estão além.


Sentar é essencialmente um espaço simplificado. Nossa vida diária está em constante movimento: acontecem muitas coisas, muitas pessoas falam, muitos acontecimentos ocorrem. Em meio a tudo isso, é muito difícil sentir o que somos em nossa vida. Quando simplificamos a situação, quando deixamos os elementos externos de lado e nos retiramos do alcance do toque do telefone, da televisão, das pessoas que nos visitam, do cachorro que precisa passear, temos uma chance – que é, exatamente, a coisa mais valiosa que existe – de ficar de frente para nós mesmos. A meditação não está relacionada com algum estado e, sim, com seu praticante. Não diz respeito a alguma atividade, ou a consertar ou a conseguir algo. Refere-se a nós. Se não simplificamos a situação, a oportunidade de dar uma boa olhada em nós mesmos fica muito reduzida, porque aquilo que nos propomos a ver não somos nós e, sim, tudo o mais. Se algo dá errado, para o que olhamos? Olhamos para o que saiu errado e, em geral, para aqueles que a nosso ver foram os responsáveis. Ficamos o tempo todo olhando para fora, e não para nós.

Quando menciono que a meditação diz respeito a quem a pratica, não pretendo que nos comprometamos numa auto-análise. Não é isso também. Então fazemos o quê?

Depois de termos assumido nossa melhor postura (que deveria ser equilibrada, fácil), ficamos apenas sentados ali, praticamos zazen. O que significa ‘apenas sentados ali”? Essa é a mais exigente de todas as atividades. Por via de regra, na meditação, não fechamos os olhos. Neste momento, porém, gostaria que fechassem os olhos e ficassem apenas sentados. O que está acontecendo? Toda espécie de coisas. Uma fisgada mínima no ombro esquerdo; uma pressão no lado… Percebam o rosto por um momento. Sintam-no. Estará tenso em algum lugar? Em torno da boca, na testa? Vamos descer um pouco mais. Observem o pescoço, somente sintam-no. Agora, os ombros, as costas, o peito, a região abdominal, os braços, as coxas. Continuem sentindo tudo que encontrarem. Agora sintam a respiração entrando e saindo. Não tentem controlá-la, apenas senti-la. Nossa primeira reação é tentar segurar a respiração. Deixe que aconteça naturalmente. No alto do peito, no meio, na barriga, pode parecer tensa. Apenas sinta como está. Sintam tudo isso. Se um carro passa lá fora, ouçam-no. Se um avião passar, observem-no. Talvez ouçam o barulho cíclico do motor da geladeira. Que seja! E o que vocês têm de fazer, positivamente é tudo o que vocês têm de fazer: experimentar isso e apenas ficar com essa experiência. Agora podem abrir os olhos.

Se conseguirem ficar fazendo isso durante três- minutos, é um milagre. O normal é que, decorrido um minuto, começamos a pensar. Nosso interesse em apenas acompanhar a realidade (que é o que acabamos de fazer) é muito reduzido. ‘Você quer dizer que zazen é só isso?” Não gostamos dele. “Estamos em busca da iluminação, não?” Nosso interesse pela realidade é extremamente pequeno. Nós queremos pensar. Queremos nos afligir com todas as nossas preocupações. Queremos entender qual é o sentido da vida. Assim, antes de nos darmos conta, teremos esquecido por completo deste momento e teremos divagado em pensamentos sobre as coisas: o namorado, a namorada, o filho, o patrão, o medo permanente… e por aí afora! Nada há de vergonhoso nesse fantasiar, exceto que, quando estamos imersos nele, perdemos alguma outra coisa. Quando estamos perdidos em nossos pensamentos, quando estamos sonhando, o que perdemos? A realidade. Nossa vida nos escapou.

Isso é o que os seres humanos fazem. Não fazemos isso só uma parte do tempo: fazemos a maior parte do tempo. Por quê? Claro que vocês sabem a resposta. Fazemos porque estamos tentando nos proteger. Estamos tentando nos livrar de nossas dificuldades atuais, ou pelo menos entendê-las. Não há nada de errado em nossos pensamentos autocentrados, exceto que, quando nos identificamos com eles, nossa visão da realidade fica bloqueada. Assim, o que deveríamos fazer quando os pensamentos aparecem? Deveríamos rotulá-los. Coloquem rótulos específicos: não só “pensamento, pensamento” ou “preocupação, preocupação”, mas um rótulo específico. Por exemplo: “Estou pensando que ela é muito mandona”; “Estou pensando que ele é muito injusto comigo”; “Estou pensando que nunca faço as coisas certas”. Sejam específicos. Se os pensamentos estiverem vindo em avalanche, numa velocidade tão grande que vocês não sintam mais nada senão confusão, então simplesmente rotulem essa confusão nebulosa de “confusão”. Mas se insistirem em localizar pensamentos isolados, cedo ou tarde, eles virão.

Quando praticamos dessa maneira, passamos a nos conhecer, a saber como nossa vida funciona, o que estamos fazendo com ela. Se percebemos que determinados pensamentos reaparecem centenas de vezes, ficamos sabendo a nosso respeito algo que antes desconhecíamos. Talvez nosso pensamento incessante refira-se ao passado ou ao futuro. Algumas pessoas estão sempre pensando sobre acontecimentos, enquanto outras pensam em pessoas. Há quem pense sempre a respeito de si mesmo. Em algumas, os pensamentos são quase só julgamentos a respeito dos outros. Enquanto não os rotularmos durante quatro ou cinco anos, não nos conheceremos bem. Quando damos rótulos precisos e meticulosos a nossos pensamentos, o que acontece com eles? Eles começam a aquietar-se. Não é preciso que nos obriguemos a livrar-nos deles. Quando eles se acalmam, podemos retornar à experiência do corpo e da respiração, muitas vezes seguidas. Não há como deixar de enfatizar que não fazemos isso apenas duas ou três vezes; fazemos dez mil vezes. Com isso, nossa vida se transforma. Essa é uma descrição teórica do sentar. E muito simples. Não há nada de complicado nela.

Consideramos agora uma situação da vida cotidiana. Suponhamos que você trabalha mima companhia de aviação, e lhe contam que o contrato com o governo está terminando e é provável que não seja renovado. Você pensa com seus botões: “Vou perder meu emprego. Vou ficar sem rendimentos e tenho uma família para sustentar. E terrível!”. O que acontece então? Sua mente começa a remoer o problema sem parar. “O que acontecerá? O que faço?” A mente começa a ficar cada vez mais rápida com a preocupação.

Claro que não há nada de errado em planejar com antecedência. Temos de planejar. Porém, quando ficamos aborrecidos, não é porque apenas planejamos, mas porque ficamos obcecados. Viramos a situação do avesso de todos os jeitos. Se não soubermos o que significa fazer uma prática com nossos pensamentos de preocupação, o que ocorre em seguida? Os pensamentos produzem uma emoção e ficamos mais agitados ainda. Toda agitação emocional é causada pela mente. Se permitirmos que isso aconteça durante um certo tempo, acabaremos em muitos casos ficando doentes ou mentalmente deprimidos- Se a mente não se incumbir da situação com discernimento, o corpo o fará. Ele nos ajudará a sair dessa. E como se dissesse: “Se você não tomar conta da situação, creio que eu terei de fazê-lo”. Assim, produzimos nosso próximo resfriado, nossa alergia seguinte, nossa próxima úlcera, seja qual for nosso estilo. A mente que não está consciente de si produzirá enfermidades. Isto não é uma crítica, porém, não conheço quem nunca adoeça, inclusive eu. Quando o desejo de nos preocupar é forte, criamos dificuldades. Com uma prática regular, apenas o fazemos menos. Tudo aquilo de que não formos conscientes frutificará em nossa vida, de um jeito ou de outro.

Do ponto de vista humano, as coisas que dão errado em nossa vida são de dois tipos. Um são os fatos que acontecem fora de nós e o outro são os que acontecem dentro, como as doenças físicas. Ambas são a nossa pratica e trabalhamos com elas do mesmo modo. Rotulamos todos os pensamentos que acontecem à volta deles e os vivenciamos em nosso corpo. O processo é o próprio pensar.

Falar a esse respeito parece, de fato, fácil. Entretanto, fazê-lo é terrivelmente difícil. Não conheço ninguém que possa fazê-lo o tempo todo. Conheço algumas pessoas que conseguem uma boa parte do tempo. Mas, quando praticamos desta forma, tomando consciência de tudo que entra em nossa vida (interna e externa), ela começa a transformar-se. Aumentamos nossa força e nosso discernimento; às vezes, conseguimos inclusive viver num estado de iluminação, que só significa experimentar a vida como ela é. Não é nenhum mistério.

Se você é novato na prática, é importante saber que ficar apenas sentado na almofada durante quinze minutos já é uma vitória. E ótimo ficar sentado com essa compostura, somente ficar ali.

Se tivéssemos medo de ficar na água e não soubéssemos nadar, a primeira vitória seria apenas mergulhar. O próximo passo poderia ser molhar o rosto. Se fôssemos ótimos nadadores, o desafio poderia ser conseguir bater a mão na água numa determinada inclinação, a cada braçada. Isso significa que um é melhor do que o outro? Não. Ambos são perfeitos, cada qual em sua etapa do caminho. A prática, em qualquer estágio, é simplesmente ser quem somos a cada momento. Não é uma questão de sermos bons ou maus, melhores ou piores. As vezes, depois das palestras, as pessoas comentam: “Não entendi isso”. Isso também está perfeito. Nosso entendimento aumenta com o tempo, contudo, a qualquer momento, somos perfeitos em ser do jeito que somos.

Começamos a aprender que só existe uma coisa na vida em que podemos confiar. Qual é? Podemos dizer: “Confio em meu companheiro”. Podemos amar nosso marido, nossa esposa; mas não podemos nunca confiar cegamente neles porque uma outra pessoa (assim como nós) é sempre não confiável até certo ponto. Não há uma pessoa na face da Terra em quem possamos confiar por completo, embora, sem dúvida, possamos amá-la e desfrutar sua companhia. Em que, então, podemos confiar? Se não é em uma pessoa, em quê? Em que podemos confiar na vida?, perguntei a alguém que me respondeu: “Em mim”. Você pode confiar em si mesmo? A autoconfiança é uma boa coisa, porém é inevitavelmente limitada.

Existe uma coisa na vida em que sempre podemos confiar: na vida tal como é. Vamos falar em termos mais concretos. Imagine que existe uma coisa que eu quero muito: talvez casar com uma certa pessoa, ou fazer um curso de especialização, ou ter um filho saudável e feliz. No entanto, a vida como é poderia ser exatamente o inverso do que eu desejo. Não sabemos se iremos ou não casar com aquele alguém. Quem sabe, se casarmos, aquela pessoa ideal morra amanhã. Pode ser que consigamos ser especialistas ou não. É provável que sim, mas não podemos contar com isso. Não podemos contar com coisa alguma. A vida será sempre do jeito que é. Então, por que não conseguimos confiar nesse fato? O que é tão difícil a esse respeito? Por que estamos sempre incomodados? Suponha que sua casa tenha acabado de ser destruída por um terremoto e você está quase perdendo um braço e todas as suas economias. Será que dá para confiar na vida tal qual ela se apresenta? Você consegue ser assim?

Confiar que as coisas são como são é o segredo da vida. Porém, não queremos saber de nada disso. Posso confiar absolutamente que, no ano que vem, minha vida mudará, estará diferente, e, no entanto, será sempre do que jeito que é. Se eu tiver um ataque cardíaco amanhã, posso confiar que, porque eu o tive, eu o tenho. Posso me apoiar na vida como ela é.

Quando fazemos um investimento pessoal em nossos pensamentos, criamos o “eu” (como diria Krishnamurti), então nossa vida começa a não funcionar. Eis por que rotulamos os pensamentos, desfazendo o investimento. Depois de termos ficado sentados por tempo suficiente, podemos notar nossos pensamentos apenas como input sensorial. Podemos nos ver atravessando os estágios preliminares a este: primeiro sentimos que nossos pensamentos são reais, e a partir deles criamos as emoções autocentradas e, a partir destas, os obstáculos que nos impedem de ver a vida como ela é, porque, se estamos contidos pelas emoções autocentradas, não conseguimos enxergar as pessoas e as situações com clareza. Um pensamento em si é só input sensorial, um fragmento de energia. Entretanto, tememos ver os pensamentos tais como são.

Quando rotulamos o pensamento, retrocedemos e nos desapegamos da identificação. Há uma enorme diferença entre dizer: “Ela é impossível” e “Estou pensando que ela é impossível”. Se persistirmos na prática de rotular qualquer pensamento, o revestimento emocional começa a dissolver-se e ficamos, enfim, com o fragmento impessoal de energia, ao qual não precisamos ficar apegados. Se, porém, acreditamos que nossos pensamentos são reais, nossa conduta se fundamentará neles. Se agirmos a partir deles, nossa vida ficará uma confusão. Mais uma vez, a prática é o trabalho com este processo até que o tenhamos impregnado em nossos ossos. A prática não se refere a entender com a mente. Ela tem de ser nossa carne, nossos ossos, nós mesmos. Claro que temos de ter pensamentos orientados para a vida, como seguir uma receita, consertar um equipamento, planejar as férias. Mas não necessitamos dessa atividade emocionalmente autocentrada a que chamamos pensar. Não é de fato pensar; é uma aberração do pensar.

O zen refere-se a uma vida ativa, envolvida. Quando conhecemos bem nossas mentes e as emoções que nosso pensamento cria, temos a possibilidade de ver melhor o que é a nossa vida e o que precisa ser feito; em geral, é a próxima coisa que temos logo à frente. O zen tem que ver com uma vida de ações, não com um fazer nada passivo. No entanto, as ações têm de estar baseadas na realidade. Quando se baseiam em falsos sistemas de pensamento (fundamentados em nosso condicionamento), têm alicerces precários. Depois de enxergarmos com clareza os sistemas de pensamento, seremos capazes de ver o que precisa ser feito.

O que estamos fazendo não é nossa reprogramação; é nossa libertação de todos os programas, notando que são vazios, sem realidade. A reprogramação é só saltar de um caldeirão para outro. Pode ser que tenhamos aquilo que pensamos ser uma melhor programação; mas o propósito do sentar é não ser conduzido por nenhum programa. Imaginemos que há o programa chamado “Não tenho autoconfiança”. Suponhamos que decidimos reprogramá-lo para “Tenho autoconfiança”. Nenhum dos dois conseguirá se sair muito bem frente às pressões da vida, porque envolvem um “eu”. Este “eu” é uma invenção muito frágil – aliás, irreal – e é com facilidade enganado. Na realidade, nunca houve um “eu”. O que importa é enxergar que é vazio, uma ilusão, que é diferente de dissolvê-lo. Quando falo que é vazio, quero dizer que não tem uma realidade básica; é só uma criação de pensamentos autocentrados.

Praticar o zen nunca é tão fácil quanto falar sobre ele. Até mesmo os estudantes que têm um certo entendimento do que estão fazendo, às vezes, costumam se afastar da prática básica. Apesar disso, quando sentamos bem, tudo o mais se incumbe de si mesmo. Por essa razão, se estamos praticando o sentar há cinco ou vinte anos, ou estamos apenas no começo, é importante sentar com um grande e meticuloso cuidado.

Texto de Charlote Joko Beck - extraído do livro "Sempre Zen"

quinta-feira, 15 de agosto de 2019

Monges são ótimos amigos




O Buda Shakyamuni(1) dizia: “ter ótimos amigos e estar em boa companhia não é metade do caminho, não é parte do caminho, é o próprio caminho”. Ele enfatizava assim a importância de ter bons amigos.

O Mestre Dôgen também escreveu no Shôbôgenzô Zuimonki(2): “Mesmo os estudantes de Zen que não tenham muita disposição em buscar o Caminho, apenas por estarem próximos a bons praticantes, acabam por criar bons relacionamentos e enfim podem ver e ouvir como eles. Os bons amigos estão conosco, não importa quão sofrida e solitária seja a prática”.

Essas palavras mostram a docilidade, a sabedoria e a compaixão de Mestre Dôgen, que se colocava sempre no plano das pessoas comuns, mesmo daqueles de fé mais fraca.

O caractere “so” em japonês deriva do sânscrito “sangha”(3) e quer dizer “grupo harmonioso”. Uma pessoa apenas não é chamada de “so”, não pode formar uma “san gha”. Buda Skakyamuni, conhecendo a fraqueza humana, não aconselhava a prática solitária.

Sozinhos não conseguimos nos empenhar verdadeiramente, nem mesmo por apenas uma hora, em zazen. Se, por outro lado, o fizermos com outras pessoas, podemos praticar o zazen por três dias, ou mesmo durante um retiro de uma semana, ou até dedicar toda nossa existência à vida monástica. Pode parecer que o zazen é uma prática solitária, mas isto não é verdade. Não podemos ter sucesso sozinhos. Como dizia o Mestre Dôgen: “A prática é a força do grupo”. A perseverança de todo o grupo sustenta a prática de cada um. E por isso que dizemos que “os monges são ótimos amigos”.

Reverenciando aqueles que despertaram para o verdadeiro caminho, seguindo os ensinamentos de Buda, mante-mos a prática constante em nosso dia a dia, sustentados por nossos amigos monges que compartilham de nossas aspirações. Quando doentes, sou doente. Quando pobres, sou pobre. Bem no meio da doença e da pobreza, ou de qualquer situação que surja, confiamos nos Três Tesouros: Buda, o ser iluminado; Darma, seus ensinamentos; e Sangha, a comunidade harmoniosa de praticantes. São os Três Tesouros que nos permitem praticar. Existe alguma felicidade maior do que esta?


(Texto de Shundo Aoyama, extraído do livro "Para uma pessoa bonita")


1Buda Sakyamuni – O Buda histórico, fundador do Budismo, cujo nome original era Príncipe Gautama Sidharta. Shakya se refere ao nome do clã a que ele pertencia e muni significa sábio.
2Shôbôgenzô Zuimonki – literalmente: O olho – tesouro do Darma correto, obra de Eihei Dôgen. ele pretendia escrever cem capítulos, porém morreu antes de terminar. Há uma versão oficial com 95 capítulos. O olho – tesouro da lei verdadeira e A suprema mente de nirvana são considerados os ensinamentos de Buda transmitidos a seu discípulo Makakashô..
3Sangha – termo sânscrito que indica uma comunidade de praticantes ou monges.

quinta-feira, 8 de agosto de 2019

3 pontos para uma vida espiritual autêntica, segundo o zen de James Ford

Hirō Isono (1945 - 2013)


Quando você segue uma autoridade, sua mente se torna infantil, estreita, mecânica, sem nenhuma substância por trás”, diz o filósofo indiano Jiddu Krishnamurti, conhecido por seus ensinamentos pela emancipação e libertação do ser humano de sua própria escravidão e imaturidade mental. Se acreditarmos nessa frase dele, poderíamos dizer que estaríamos seguindo uma autoridade, mas, também, quem sabe, em direção a nos emancipar dela. O que seria um grande ponto para termos uma vida espiritual ou uma prática espiritual autêntica: seguir no caminho por nós mesmos. Pensando, percebendo e buscando por nós mesmos.

O reverendo zen James Ford tem 3 dicas nessa direção. As três seguem traduzidas mais abaixo, como guias gerais que podem ajudar a voltarmos a nós mesmos (ainda que uma dica precise de outra pessoa).

Ford considera esses 3 pontos abaixo fundamentais para uma vida espiritual autêntica. O ponto de Krishnamurti poderia facilmente ser um quarto nesta lista. E, logo depois, eu mesmo adiciono um quinto, para sair um pouco da pura papagaiação. Ei-los:

1) Você precisa passar tempo calado. Se você permanece todo o tempo no barulho, é difícil prestar atenção, dificil perceber as lições e a lição.

2) Você precisa de regularidade. Fazer uma vez pode abrir seu coração e seus olhos. Acontece. Mas a maioria de nós precisa voltar e praticar e praticar e praticar.

3) Você precisa de alguém para lhe supervisionar. O cérebro é um grande mentiroso. Todos nós nos contamos todo tipo de histórias sobre o que precisamos e merecemos, e apenas algumas delas são verdadeiras. E também, ao longo do caminho espiritual, temos várias experiências. A maioria com limitado valor, ou mesmo sem valor nenhum. Alguém que trilhou o caminho antes de você, alguém em que você confie, e que esteja sempre disposto a dizer a verdadeira nua e crua, tem peso de ouro.

Ford diz que se fizermos isso, nossa “prática espiritual não será somente sobre reduzir a pressão sanguínea, será sobre chegar às portas do paraíso, e entrar”.

O que me leva a querer adicionar, como falei, este quinto ponto: precisamos de uma motivação real de vida ou morte. Sem isso, não chegaremos a lugar nenhum. Será tudo superficial, egoico e sem profundidade, o que pode não ter verdade nenhuma, e portanto não ter nada de espiritualidade genuína.

terça-feira, 30 de julho de 2019

O NOBRE

Aquele que é inofensivo, que não fere nem causa ou incentiva a morte de qualquer ser, fraco ou forte, a este eu chamo de nobre.

Aquele que é amável entre os hostis, suave entre os agressivos e livre de ambições entre os que cobiçam, a este eu chamo de nobre.

Aquele cujas palavras são gentis, instrutivas, verdadeiras e inofensivas, a este eu chamo de nobre.

Aquele incapaz de tomar aquilo que não lhe tenha sido dado pelo próprio dono, seja grande ou pequeno, largo ou curto, bom ou ruim, a este eu chamo de nobre.

Aquele que mantem sob controle seu corpo, sua fala e sua mente, a tal pessoa eu chamo de nobre.

(O Dhammapada - O Nobre Caminho do Darma do Buda)

quinta-feira, 25 de julho de 2019

A mulher pobre e a lamparina







Na Índia antiga existia um reino chamado Magadha, cujo soberano era Ajatashatru. Ele ofereceu ao Buda centenas de carroças carregadas de potes com óleo de linhaça.
 Ao saber disso, uma mulher pobre também desejou oferecer algo ao Buda. Ela decidiu cortar seus longos cabelos e vendê-los para trocar por óleo, o suficiente para manter uma lamparina acesa por metade da noite.

Um forte vendaval surpreendeu o reino naquela noite. Todas as lamparinas se apagaram, exceto a da mulher pobre. A luz, em vez de enfraquecer, tornou-se cada vez mais forte.

Então, Shakyamuni disse que no futuro a mulher certamente se tornaria buda. Ouvindo isso, o rei Ajatashatru ficou furioso, pois ele havia oferecido ao Buda uma quantia dez mil vezes maior de óleo do que a mulher pobre.

Conclusão

Esta parábola ensina que dentre todos os tipos de oferecimentos, aquele que é feito com sinceridade é o que possui o maior valor. Apesar do oferecimento simples da mulher, o Buda percebeu sua fé pura e sincera. Mas o rei, muito arrogante, quis apenas impressionar o Buda.


Parábola extraída e adaptada da RDez, ed. 162, abril 2015

terça-feira, 23 de julho de 2019

Tenzo Kyokun - Mestre Dogen (trecho)




"Quando se prepara a comida, nāo olhe os ingredientes da mesma maneira que as pessoas comuns, e nāo leve em conta os seus sentimentos pessoais. Que sua atitude seja aquela da pessoa que deseja construir um grande templo a partir de legumes comuns, ou que tenta explicar o Darma do Buda através das atividades mais insignificantes. Quando você faz uma sopa com legumes comuns, nāo se deixe levar por sentimentos de aversão à eles, nem os considere com desprezo, tampouco salte de alegria somente porque lhe deram ingredientes de qualidade superior para preparar um prato especial. Do mesmo modo, que você nāo abusa de um prato porque ele é especialmente bom, nāo há razão para detestar um prato comum. Nāo seja negligente e desatento somente porque os ingredientes parecem comuns, e nāo pense que seria melhor trabalhar com coisas de boa qualidade. Sua atitude em relação às coisas nāo deveria variar segundo suas qualidades. Alguém que se deixa influenciar pela qualidade de uma coisa, ou que muda sua atitude, seu discurso e suas maneiras segundo a aparência ou a posição social das pessoas que encontra, não é um estudante do Caminho."
Treinamento no Vila Zen/RS



segunda-feira, 8 de julho de 2019

As Dez Figuras do Boiadeiro por Chögyam Trungpa - Domando a Mente

Procurando o touro
No1-by_Tenshō_ShūbunA inspiração para este primeiro passo, procurar o touro, é a sensação de que as coisas não são íntegras, de que alguma coisa está faltando. Este sentimento de perda produz dor. Você está procurando algo que faça a situação se endireitar. Você descobre que as tentativas do ego na direção de criar um ambiente ideal são insatisfatórias.
Descobrindo as pegadas
No._2Ao compreender a origem desta dor, você descobre a possibilidade de transcende-la. Este é o reconhecimento das Quatro Nobres Verdades. Você vê que a dor resulta dos conflitos criados pelo ego, e descobre as pegadas do touro, que são suas pesadas marcas, e que tomam parte em todos os eventos os transformando em jogos. Você é inspirado por conclusões lógicas inabaláveis, não pela fé cega. Isto corresponde aos caminhos Shravakayana e Pratyekayana.
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Encontrando o touro
No._3Você fica pasmo ao perceber o touro e então, porque já não há mais nenhum mistério, você se pergunta se ele está realmente ali; você percebe sua qualidade insubstancial. Você perde a noção de um critério subjetivo. Quando você começa a aceitar esta percepção da não-dualidade, você relaxa, porque não precisa mais defender a existência de seu ego. Você pode dar-se ao luxo de ser aberto e generoso. Você começa a ver outras formas de lidar com seus projetos e isso em si é alegria, o primeiro nível espiritual de conquista de um Bodisatva.
Capturando o touroNo._4
Após ter o vislumbre do touro, você descobre que a generosidade e a disciplina não são suficientes parar lidar com suas projeções, você ainda tem que transcender completamente a agressão. Você tem que reconhecer a precisão dos meios hábeis e a simplicidade de ver as coisas como elas são, o que está ligado com a compaixão plenamente desenvolvida. O subjugar da agressão não pode ser feito num panorama dualista – é preciso um compromisso total com o caminho compassivo do Bodisatva, ou seja, um desenvolvimento mais amplo da paciência e do vigor.
Domando o touro
No._5Uma vez capturado o touro, atinge-se sua doma através da atenção meditativa panorâmica e do lancinante chicote do conhecimento transcendental. O Bodisatva conquistou as ações transcendentes (paramitas – 6 perfeições – generosidade, ética, energia estável, paciência, concentração e sabedoria) – e não se fixa a coisa alguma.
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Montando no touro e indo para casa
No._6Já não há mais nenhuma busca. O touro (a mente) finalmente obedece ao mestre e se torna energia criativa. Este é o rompimento final ao estado da iluminação – o samadhi vajra do Décimo Primeiro Bhumi. Com o desdobrar da experiência de Mahamudra, a luminosidade e cor da mandala transformam-se na música que guia.
Transcendido o touro
No._7Mesmo aquela alegria e cor torna-se irrelevante. A mandala de símbolos e energias do Mahamudra se dissolve no Maha Ati através da total ausência da ideia de experiência. Não há mais touro. A louca sabedoria torna-se cada vez mais evidente e você abandona completamente a ambição de manipular.
Transcendidos touro e eu
No._8Esta é a ausência tanto do esforço quanto do não-esforço. É a imagem desnuda do princípio primordial do Buda. Esta entrada no Dharmakaya é a perfeição do não-vigiar – não há mais critérios, e a compreensão de Maha Ati como um estágio definitivo é completamente transcendida.
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Alcançando a fonte
No._9Já que este espaço e abertura e a total ausência de medo estão presentes, a brincadeira espontânea das sabedorias é um processo natural. A fonte da energia que não precisa ser buscada se manifesta; é como se você fosse rico em si e não como se fosse enriquecido por algum fator. Porque há tanto calor básico quanto espaço básico, a atividade de compaixão do Buda está viva e assim toda comunicação é criativa. É uma fonte no sentido de ser o tesouro inexaurível da atividade do Buda. Este é, portanto, o Sambhogakaya.
Em meio ao mundo
No._10O Nirmanakaya é o estado completamente desperto de estar em meio ao mundo. Sua ação é como a lua refletindo em centenas de tigelas de água. A lua não mantém o desejo de refletir, mas esta é sua natureza. Trata-se de lidar com a terra e a derradeira simplicidade, transcendendo o seguir o exemplo de alguém. É o estado de “completo fiasco” ou “cachorro velho”. Você destrói o que quer precise ser destruído, subjuga o que quer que precise ser subjugado, e você se importa com o que quer que precise que você se importe.
(texto retirado de Budismo Petrópolis)

AVISO

Em observância à recomendação do Decreto Distrital, as atividades do Zen Brasília serão temporariamente suspensas, inclusive a Jornada de Z...