Na prática zen nós saímos de uma vida dramática, espécie de novela das 20h, para uma vida não-dramática. A despeito do que possamos dizer, todos nós gostamos muito de nossos dramas pessoais. A razão para tanto? Seja qual for o nosso drama particular, sempre estamos no papel principal que é onde nós queremos estar. E, pela prática, nós gradualmente nos deslocamos para longe dessa preocupação com nós mesmos. Assim, sair de uma vida dramática para uma vida não-dramática, embora possa parecer sem nenhum atrativo, é do que trata a prática zen.
Examinemos isso de perto.
Quando começamos a praticar, é bom começar respirando algumas vezes bem fundo, enchendo a cavidade abdominal, o meio do peito e embaixo dos ombros, até estarmos repletos de ar; depois, soltamos o ar, interrompendo a expiração um instante. Faça isso três ou quatro vezes. Em certo sentido, é artificial, mas ajuda a criar um certo equilíbrio e forma uma base conveniente para se sentar e praticar. Depois de termos feito isso, o passo seguinte é esquecer exatamente isso, esquecer de controlar a respiração. Não o esqueceremos por completo, é claro, mas é inútil controlar a respiração. Em vez disso, apenas vivencie esse processo, o que é muito diferente. Não estamos tentanto fazer uma respiração lenta, longa e regular, como muitos livros sugerem. Em lugar disso, o que queremos é deixar que o ar seja o comandante, para que a respiração esteja nos respirando. Se a respiração for superficial, que seja assim. Quando nos tornamos a nossa respiração, por sua própria pulsação a respiração se torna mais lenta. A respiração permanece superficial porque queremos pensar em vez de vivenciar a nossa vida. Quando fazemos isso, tudo se torna mais superficial e controlado. A palavra retesado é bastante sugestiva: descreve como subimos para a cabeça, a garganta, os ombros e lá nos tensionamos; estamos com muito medo e nossa respiração também fica alta. Uma respiração que consegue ser abdominal, como tende a ocorrer após anos de prática, é aquela que vem quando a mente perdeu as esperanças. Tudo aquilo pelo que esperamos é do que lentamente aprendemos a desistir e, então, a respiração desce. Não é algo que precisamos tentar fazer. A prática consiste em vivenciarmos a respiração como ela é.
(Charlotte Joko Beck - Nada de Especial - Vivendo Zen, Ed. Saraiva 1ª Ed. 1994)
Nenhum comentário:
Postar um comentário