Texto de Shundo Aoyama, extraído do livro " Para uma pessoa bonita"
Quando fui convidada para uma cerimônia do chá em um certo templo, ao esperar na ante-sala, notei pendurada no tokonoma(1) a pintura de uma cabaça com as palavras do Mestre Zen Takashina Rosen(2): “Faz barulho porque não está completo”.
Fiquei emudecida diante do humor que ali se escondia, e, como se houvesse levado um golpe dolorido de um bastão, sem perceber exclamei: “uh!”
Uma cabaça cheia até a boca não tem som quando sacudida, mas se houver um pouco de saquê(3) lá no fundo, fará barulho. Os seres humanos são como cabaças: a pessoa sábia, iluminada, é tranquila em qualquer circunstância, como se nada a perturbasse. Exaltar-se, justificar-se e se lamentar são provas de falta de conteúdo. As palavras verdadeiras do Mestre Zen nessa pintura nos tocam profundamente.
Certa vez, tive essa mesma compreensão ao descer um córrego em uma canoa. Na nascente, onde a água é rasa, a superfície é agitada e barulhenta. Perto da foz, onde o riacho se torna profundo, a superfície é calma e tranquila, fluindo silenciosamente.
Sempre que começo a me sentir inquieta, lembro-me das palavras do Mestre Takashina Rosen.
(1)Tokonoma – nicho construído nas casas japonesas onde se colocam objetos de arte, peças raras, caligrafias ou pinturas, bem como arranjos de flores, seguindo regras estéticas tradicionais, marcando cada estação do ano, festividade ou encontro.
(2). Takashina Rosen (1896-1968) – Mestre Zen Daikan Doko (título recebido do Imperador Japonês) é o Grande Monge Gyokudô Rôsen, que foi abade superior dos dois templos sedes da Escola Soto Zen no Japão e fundador dos primeiros templos da Escola Soto Zen na América do Sul (Brasil).
(3) Saquê – bebida alcoólica de arroz fermentado.
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