terça-feira, 27 de outubro de 2015
quarta-feira, 21 de outubro de 2015
Relações e conflitos
“Nossas identidades são flutuantes, não têm sabedoria e nós não temos gestão própria sobre elas. Portanto, as relações são problemáticas, não só conosco mas com os outros também. Quando nós nos juntamos somos como duas boias no mar revolto: no início estão próximas mas, ao final de um certo tempo, cada uma pode estar em um oceano distinto. Os ventos e as ondas vão nos arrastando, não temos propriamente capacidade de gerir, de determinar a direção. No budismo, nosso objetivo é recuperar esta direção. Como recuperar esta direção e como, após recuperá-la, podemos nos aproximar e gerar relações estáveis e satisfatórias?”
Lama Padma Samten no livro “Relações e Conflitos”
terça-feira, 20 de outubro de 2015
segunda-feira, 19 de outubro de 2015
O Ego que frauda a Espiritualidade e até a Meditação
Foto: João Antônio |
“Além do Materialismo Espiritual”
Por Chögyam Trungpa Rinpoche
De acordo com a tradição budista,
o caminho espiritual é o processo de atravessar e superar a nossa confusão, de
descobrir o estado desperto da mente. Quando este estado se encontra entulhado
pelo ego e pela paranoia que o acompanha, assume o caráter de um instinto
subliminar. Dessa forma, não se trata de construir o estado desperto da mente,
mas sim de queimar as confusões que o obstruem. No processo de consumir as
confusões, descobrimos a iluminação. Se o processo fosse outro, o estado
desperto da mente seria um produto dependente de causa e efeito e, assim,
passível de dissolução. Tudo o que é criado, mais cedo ou mais tarde, tem de
morrer. Se a iluminação fosse criada dessa maneira, haveria sempre a
possibilidade de o ego reafirmar-se, provocando um retorno ao estado de
confusão. A iluminação é permanente porque não a produzimos; apenas a
descobrimos. Na tradição budista, a analogia do Sol que surge por trás das
nuvens é freqüentemente empregada para explicar o descobrimento da iluminação.
Na prática da meditação, removemos a confusão do ego a fim de vislumbrar o
estado desperto. A ausência da ignorância, da sensação de opressão, da
paranoia, descerra uma visão fantástica da vida. Descobrimos um modo diferente
de ser.
O cerne da confusão é o fato de o
homem ter um senso de ego que lhe parece contínuo e sólido. Quando ocorre um
pensamento, uma emoção, ou um evento, há o sentido de que alguém tem
consciência do que está acontecendo. Você sente que você está lendo estas
palavras. Esse senso do eu, na realidade, é um evento transitório, descontínuo,
que em nossa confusão parece perfeitamente estável e contínuo. Como tomamos por
real a nossa visão confusa, lutamos para manter e incrementar esse eu sólido.
Tentamos alimentá-lo com prazeres e escudá-lo contra a dor. A experiência
ameaça continuamente revelar-nos nossa transitoriedade, de modo que lutamos
continuamente para encobrir qualquer possibilidade de descoberta da nossa
verdadeira condição. “Mas”, poderíamos perguntar, “se a nossa verdadeira
condição é um estado desperto, por que nos ocupamos tanto em evitar que tomemos
consciência disso?” Porque estamos tão imersos em nossa confusa visão do mundo
que consideramos real o único mundo possível. Essa luta por manter o senso de
um eu sólido e contínuo é obra do ego.
O ego, contudo, consegue apenas
sucesso parcial em sua tentativa de defender-nos do sofrimento. É a
insatisfação que vem junto com a luta do ego que nos inspira a examinar o que
estamos fazendo. E, uma vez que sempre existem hiatos na consciência que temos
de nós mesmos, torna-se possível algum discernimento.
Uma interessante metáfora
empregada no Budismo tibetano para descrever o funcionamento do ego é a dos
‘Três Senhores do Materialismo”: o “Senhor da Forma”, o “Senhor da Fala”, e o
“Senhor da Mente”. Na discussão que se segue sobre os Três Senhores, as
palavras “materialismo” e “neurótico” dizem respeito à ação do ego.
O Senhor da Forma refere-se à
perseguição neurótica do conforto físico, da segurança e do prazer. Nossa
sociedade altamente organizada e tecnológica reflete nossa preocupação em
manipular o ambiente físico de modo a nos salvaguardar das irritações
provenientes dos aspectos crus, rudes e imprevisíveis da vida. Elevadores
acionados, botões de comando, carne empacotada, ar condicionado,
privadas com descarga de água, velórios particulares, planos de aposentadoria,
produção em massa, satélites meteorológicos, máquinas de terraplenagem, luzes
fluorescentes, empregos das nove às cinco, televisão — tudo são tentativas de
criar um mundo controlável, seguro, previsível e prazeroso.
O Senhor da Forma não significa
as situações de vida em si que criamos para serem fisicamente ricas e seguras.
Refere-se, antes, à preocupação neurótica que nos impele a criá-las, a tentar
controlar a Natureza. O ego ambiciona assegurar-se e entreter-se, buscando
evitar toda e qualquer irritação. Desse modo, agarramo-nos aos nossos prazeres
e propriedades, tememos mudanças ou forçamos mudanças, tentamos criar um ninho
ou um playground.
O Senhor da Fala tem a ver com o
emprego do intelecto no relacionamento com o mundo. Adotamos grupos de
categorias que servem como alavancas, como meios para manipular fenômenos. Os
produtos mais plenamente desenvolvidos dessa tendência são as ideologias, os
sistemas de idéias que racionalizam, justificam e santificam nossas vidas.
Nacionalismo, comunismo, existencialismo, Cristianismo, Budismo — todos nos
proporcionam identidades, regras de ação e interpretações de como e por que as
coisas acontecem como acontecem. Aqui, novamente, o emprego do intelecto não é
em si mesmo o Senhor da Fala. O Senhor da Fala indica a inclinação do ego a
interpretar o que quer que seja ameaçador ou irritante de modo a neutralizar a
ameaça ou transformá-la em algo “positivo” do ponto de vista do ego.
O Senhor da Fala refere-se ao uso
de conceitos como filtros que nos resguardam de uma percepção direta do que é.
Os conceitos são levados demasiado a sério; são utilizados como instrumentos
para solidificar o nosso mundo e a nós mesmos. Se existe um mundo com coisas a
que se possa dar nomes, então o “eu”, como uma das coisas nomeáveis, também
existe. Nosso desejo é não deixar espaço algum para dúvidas ameaçadoras, para a
incerteza ou a confusão.
O Senhor da Mente refere-se ao
esforço da consciência em conservar a percepção de si mesma. O Senhor da Mente
impera quando usamos disciplinas espirituais e psicológicas como meios de
conservar a consciência que temos de nós mesmos, de nos agarrar ao senso de eu.
Drogas, ioga, orações, meditação, transes, várias psicoterapias — tudo pode ser
usado com essa finalidade. O ego é capaz de converter tudo para seu uso
próprio, inclusive a espiritualidade. Se aprendemos, por exemplo, uma técnica de
meditação dentro de uma prática espiritual particularmente benéfica, o ego se
põe, primeiro, a tratá-la como um objeto de fascinação e, depois, a
examiná-la. Por fim, visto que o ego é sólido apenas na aparência e não pode,
de fato, absorver coisa alguma; só é capaz de arremedar. Em tais
circunstâncias, ele procura examinar e imitar a prática da meditação e o modo
de vida meditativo. Depois de aprendermos todos os truques e todas as respostas
do jogo espiritual, tentamos imitar automaticamente a espiritualidade, já que o
envolvimento verdadeiro exigiria uma completa eliminação do ego, e a última
coisa que desejamos fazer é renunciar completamente a ele. Entretanto, não
podemos experimentar aquilo que estamos tentando imitar; podemos apenas
encontrar alguma área dentro dos limites do ego que pareça ser a mesma coisa. O
ego traduz tudo em termos do seu próprio estado de saúde, de suas qualidades
intrínsecas. Experimenta um sentido de grande realização e excitação quando
consegue criar um modelo desse tipo. Finalmente criou um feito tangível, uma
confirmação de sua própria individualidade.
Se formos bem-sucedidos em manter
a consciência que temos de nós mesmos através de técnicas espirituais, o
desenvolvimento espiritual autêntico será altamente improvável. Nossos hábitos
mentais se tornam tão fortes que fica difícil penetrá-los. Podemos até chegar ao
desenvolvimento totalmente demoníaco da completa “Egoidade”. Embora o Senhor da
Mente detenha o maior poder para subverter a espiritualidade, os outros dois
Senhores podem também reger a prática espiritual. O retiro no seio da Natureza,
o isolamento, a gente simples, sossegada, digna — tudo pode ser meio para nos
proteger da irritação, tudo pode ser expressão do Senhor da Forma. Ou talvez a
religião nos forneça uma racionalização para criarmos um ninho seguro, um lar
singelo mas confortável, para conseguirmos um companheiro afável e um emprego
estável e fácil.
O Senhor da Fala também se
envolve com a prática espiritual. Ao seguir um caminho espiritual, podemos
substituir nossas crenças anteriores por uma nova ideologia religiosa,
continuando, porém, a usá-la da antiga maneira neurótica. Por mais sublimes que
sejam nossas idéias, se as tomamos com excessiva seriedade e as utilizamos para
manter nosso ego, ainda assim estaremos sendo governados pelo Senhor da Fala.
Se examinarmos nossos atos, quase
todos concordaremos, provavelmente, em que somos governados por um ou mais dos
Três Senhores. “Mas”, poderíamos perguntar, “e daí? Isto é simplesmente uma
descrição da condição humana. Sim, sabemos que a tecnologia não consegue
pôr-nos a salvo de guerras, crimes, doenças, insegurança econômica, trabalho
laborioso, velhice e morte; tampouco nossas ideologias nos resguardam da
dúvida, incerteza, confusão e desorientação; nem podem as nossas terapias
proteger-nos da dissolução dos altos estados de consciência que viermos
temporariamente a alcançar ou da desilusão e angústia daí decorrentes. Mas que
outra coisa podemos fazer? Os Três Senhores parecem poderosos demais para serem
derrubados e não sabemos com que poderíamos substituí-los.” Perturbado por essas
indagações, o Buda examinou o processo pelo qual os Três Senhores governam.
Investigou por que nossas mentes os seguem e se não havia um outro caminho.
Descobriu que os Três Senhores nos seduzem criando um mito fundamental: o de
que somos seres concretos. Todavia, o mito, em última análise, é falso, uma
imensa burla, uma fraude gigantesca, a raiz do nosso sofrimento. Para fazer
essa descoberta, ele precisou romper as defesas muito complexas erguidas pelos
Três Senhores, com o fim de impedir que seus súditos descobrissem o engano
fundamental que é a origem do poder deles. Não poderemos, de maneira alguma,
livrar-nos do domínio dos Três Senhores a menos que nós, também, cortemos e
atravessemos, camada por camada, as suas complexas defesas.
As defesas dos Senhores são
criadas com material das nossas mentes, que eles utilizam para preservar o mito
básico da solidez. A fim de enxergar por nós mesmos como este processo
funciona, precisamos examinar nossa própria experiência. “Mas como,” podemos
perguntar, “haveremos de conduzir este exame? Que método ou instrumento vamos
usar?” O método descoberto pelo Buda foi a meditação. Ele verificou que lutar
para encontrar respostas não surtia efeito. Só quando havia brechas na sua luta
é que lhe acudiam discernimentos. Começou a dar-se conta de que existia dentro
de si uma qualidade sadia e desperta que só se manifestava na ausência de luta.
Por isso, a prática da meditação implica “deixar ser”.
Tem havido uma série de idéias
errôneas acerca da meditação. Algumas pessoas a consideram um estado mental
semelhante a um transe. Outras pensam nela em termos de treinamento, no sentido
de ginástica mental. A meditação, contudo, não é nenhuma dessas coisas, embora
lide com estados mentais neuróticos. Não é difícil nem impossível lidar com
tais estados. Eles têm energia, pressa e um certo padrão. A prática da
meditação implica deixar ser — uma tentativa de acompanhar o padrão, uma
tentativa de acompanhar a energia e a velocidade. Dessa forma, aprendemos como
lidar com esses fatores, como relacionar-nos com eles, não no sentido de
fazê-los amadurecer como gostaríamos, mas no sentido de conhecê-los como são e
de trabalhar com o seu padrão.”
quarta-feira, 14 de outubro de 2015
terça-feira, 13 de outubro de 2015
sexta-feira, 9 de outubro de 2015
Preguiça
"A preguiça interrompe o progresso de nossa prática espiritual. Podemos ser ludibriados por três formas de preguiça: a que se manifesta como indolência, que é o desejo de adiar; a que se manifesta como sentimento de inferioridade, que é duvidar da própria capacidade; e a que se manifesta com a adoção de atitudes negativas, que é dedicar um esforço excessivo àquilo que não é virtude."
(Sua Santidade, o Dalai Lama - Palavras de Sabedoria)
quarta-feira, 7 de outubro de 2015
terça-feira, 6 de outubro de 2015
domingo, 4 de outubro de 2015
sexta-feira, 2 de outubro de 2015
A necessidade da prática não egoísta do Caminho ou “Não pratique os ensinamentos de Buda com a idéia de ganho”
foto: Lou Gaioto |
Na prática do Caminho é necessário aceitar os ensinamentos verdadeiros de nossos antecessores, colocando de lado nossas idéias preconceituosas. O Caminho não pode ser realizado com idéias ou sem idéias. Apenas quando a mente da prática constante coincide com o Caminho, corpo e mente conhecem a paz. Quando o corpo e a mente não estão em paz, espinhos crescem no caminho da iluminação.
Como harmonizar a prática pura com o Caminho? Para assim o fazer, a mente não pode estar apegada nem rejeitando nada, necessita estar completamente livre do apego a fama e ao lucro. Ninguém se submete ao treinamento budista por causa dos outros. A mente dos praticantes budistas, como a da maioria das pessoas de nossa época, todavia, está longe da compreensão do Caminho. Elas fazem aquilo que os outros elogiam mesmo sabendo que é falso. Por outro lado, elas não praticam aquilo que os outros desdenham mesmo que saibam que este é o verdadeiro Caminho. Que lamentável!
Reflita tranqüilamente se suas palavras e ações estão unidas com o Budismo ou não. Se fizer isto, você irá perceber o quanto elas são vergonhosas. Os olhos penetrantes dos Budas-Ancestrais estão constantemente iluminando o universo inteiro.
Desde que os praticantes budistas não fazem nada para si mesmos, como eles poderiam fazer algo pela fama ou pelo lucro? Vocês devem praticar apenas pelo próprio Budismo. Os vários Budas não demonstram sua profunda compaixão por todos os seres, nem por seu próprio bem, nem para impressionar os outros. Esta é a tradição Budista.
Observe como até os animais e insetos nutrem sua prole, tolerando vários sofrimentos durante o processo. Os pais não pretendem ganhar nada com suas ações, mesmo após sua descendência ter alcançado a maturidade. No entanto, embora sejam somente pequenas criaturas, têm profunda compaixão por sua prole. Isto também é assim com relação à compaixão dos vários Budas por todos os seres. O precioso ensinamento desses vários Budas, todavia, não está limitado somente à sua compaixão; ao contrário, eles aparecem em incontáveis modos por todo o universo. Esta é a essência do Budismo.
Nós já somos as crianças de Buda; por esta razão, devemos seguir seus passos. Praticantes, não pratiquem o Darma de Buda para seu próprio interesse. Não pratiquem o Darma de Buda por fama ou lucro. Não pratiquem o Darma de Buda para obter recompensa meritosa ou poderes miraculosos. Simplesmente, pratiquem Budismo por causa do Budismo; este é o verdadeiro Caminho.
(Mestre Dogen)
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